terça-feira, 23 de julho de 2013

Escolha

“Você quer ser feliz por um instante? Vingue-se. Você quer ser feliz para sempre? Perdoe.” – Tertuliano

Ele estava inquieto. Escorria sobre seu rosto um suor quente e voluptuoso, como um rio que nunca seca. Ao contrário de sua boca, seca como o deserto mais árido. Seu corpo queimava, sem a presença de fogo. Os olhos procuravam, em vão, buscar alguma luz com a qual pudessem formar uma imagem compreensível e que não fosse apenas mais uma das alucinações que lhe passavam pela cabeça totalmente desvairada. A febre incessante consumia-lhe a lógica e o raciocínio, cada vez mais, se extinguia. Por vezes, soltava um grito, ou pensava gritar, pois a realidade e a fantasia já não mais se separavam... Pensava ouvir gritos e urros, metais que se batiam frequentemente, expressando o sofrimento de respirar aquele ar quente e fétido que o envolvia. Sentia presenças à sua volta, mas não poderia dizer ao certo se estava acompanhado ou sozinho naquele martírio. A única coisa real que lhe parecia agora era o gosto de sangue em sua boca seca e grudenta...
Deu o que parecia o seu último suspiro e, neste ínfimo instante, lembrou-se das asas que chegou a possuir, da luz que outrora via e lhe era própria. Total contraste com essa escuridão aterrorizadora de agora. Lembrou-se dos cânticos maravilhosos que saíam de sua boca, da delicadeza de sua pele... Como pudera cair em tal estado? Lembrou-se então de um sentimento que não tinha sentindo antes, mas que sentiu num momento... E após esse sentimento, envolveu-se numa nuvem escura que, enquanto o tempo passava, ia conduzindo-o para esse fim terrível... Lembrou-se então de que aquele sentimento o separava dos outros, por um momento tinha se sentido diferente e acreditou ser mais especial...
Não havia mais nada a fazer, o ar exalado não mais voltava ao seu peito... Em meio aos gritos e delírios, pronunciou uma única palavra: “Perdão...”
Acordou ao toque suave de um de seus irmãos... Olhou ao redor e estava no paraíso que sempre habitara... Possuía suas assas e sua pele era macia... Mas... Aquele sentimento de ser único, melhor que os outros... Ah... Por um momento aquele sentimento era sedutor demais!


Gerson Pereira

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