“Você quer ser feliz por um instante? Vingue-se. Você quer ser feliz
para sempre? Perdoe.” – Tertuliano
Ele estava inquieto. Escorria sobre seu rosto um suor quente
e voluptuoso, como um rio que nunca seca. Ao contrário de sua boca, seca como o
deserto mais árido. Seu corpo queimava, sem a presença de fogo. Os olhos
procuravam, em vão, buscar alguma luz com a qual pudessem formar uma imagem
compreensível e que não fosse apenas mais uma das alucinações que lhe passavam
pela cabeça totalmente desvairada. A febre incessante consumia-lhe a lógica e o
raciocínio, cada vez mais, se extinguia. Por vezes, soltava um grito, ou
pensava gritar, pois a realidade e a fantasia já não mais se separavam...
Pensava ouvir gritos e urros, metais que se batiam frequentemente, expressando
o sofrimento de respirar aquele ar quente e fétido que o envolvia. Sentia
presenças à sua volta, mas não poderia dizer ao certo se estava acompanhado ou
sozinho naquele martírio. A única coisa real que lhe parecia agora era o gosto de
sangue em sua boca seca e grudenta...
Deu o que parecia o seu último suspiro e, neste ínfimo
instante, lembrou-se das asas que chegou a possuir, da luz que outrora via e
lhe era própria. Total contraste com essa escuridão aterrorizadora de agora.
Lembrou-se dos cânticos maravilhosos que saíam de sua boca, da delicadeza de
sua pele... Como pudera cair em tal estado? Lembrou-se então de um sentimento
que não tinha sentindo antes, mas que sentiu num momento... E após esse
sentimento, envolveu-se numa nuvem escura que, enquanto o tempo passava, ia
conduzindo-o para esse fim terrível... Lembrou-se então de que aquele
sentimento o separava dos outros, por um momento tinha se sentido diferente e
acreditou ser mais especial...
Não havia mais nada a fazer, o ar exalado não mais voltava
ao seu peito... Em meio aos gritos e delírios, pronunciou uma única palavra:
“Perdão...”
Acordou ao toque suave de um de seus irmãos... Olhou ao
redor e estava no paraíso que sempre habitara... Possuía suas assas e sua pele
era macia... Mas... Aquele sentimento de ser único, melhor que os outros...
Ah... Por um momento aquele sentimento era sedutor demais!
Gerson Pereira
Nenhum comentário:
Postar um comentário